...
POBREZA
Suada, cansada, perdida na vida!
Tu me levaste o sabor do amor!
Tu vives, sonha, faz planos, é só riso,
Eu sem rumo vivendo de dor.
Continuo na senzala,
Violaram-me, tentaram mudar-me de cor,
Estou bem mais misturada, miscigenada
Continuo apertada na estreita sala,
Tiram-me tudo, até o meu chão,
Novo braseiro que a violência trás
Escuto, me atormenta, faz barulho
Continuo na senzala, sendo derradeiro
Não tenho mais meu canto,
Sobrou apenas o pranto
Saudades do se vendeu, e prometeu e enganou
Estou do lado de cá
O lado cego dos teus olhos,
Não tenho colo
Só como imbróglios
Não venha com esperança
Cansa, cansa
Cara mansa
Esconde-se por trás do ouro
Do couro do luxo
E a meia voz de lá responde:
Estamos no caminho certo do progresso, se esconde.
Continuo no mesmo lugar
Sem direito, sem teto, sim senhor.
Perdida sem rumo
Escuto o grito mudo
Sem voz, tentando ecoar.
Eu escuto, eu vejo, eu sinto.
Estou aqui, bem do lado e tão distante.
Querendo teu olhar, apenas por um instante.
Nem para todos, o sol brilha, aqui ele não vem
Compraram o nosso sol? Levaram tudo.
Só sobrou ninguém, faz o que convém.
Fomos esquecidos, foragidos, bandidos.
Jogados ao relento, nem tento.
Tirara-me a dignidade, a fala, a alma.
Deixou exposto na sala
Apenas por ser número,
O meu direito de votar
Acho que se esqueceram
Aqui não se tem direito
Deveriam ter refeito. Foi defeito?
E por que ser obrigatório?
Loucos, deixaram pelo menos um canto.
Que pode nos livrar do pranto.
Que pode levar-nos a sonhar!
Mudaram-me de nome
Isso me consome
Gostava de coração de ser chamada de escravidão
Hoje me chamam de pobreza para imprimir leveza.
Continuo na senzala, nunca mudei de ala.
Rosiane Alves
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